Com o sorriso estampado no rosto, o comerciante José Lopes
dos Santos, de 85 anos, dirige pelas ruas da Vila Chacrinha esbanjando alegria. Pela janela do veículo, exibe a mais nova
conquista: a carteira de habilitação, fruto de muito esforço e dedicação.
Ele é aluno da Educação de Jovens, Adultos e Idosos (EJAI) e
entrou no curso após perder o documento em 2016. "Sempre trabalhei na roça,
nunca pude estudar. Então, quando fui renovar a carta me pediram para escrever 'Ciretran'. Não consegui. Foi a partir daí que procurei a escola." E, de lá para cá, muita coisa mudou.
Obstinado, ele não dormia uma noite sequer sem pensar na
habilitação. "Uso o carro para tudo. Não podia ficar sem dirigir", diz. Na
tentativa de agilizar o processo, o comerciante cruzou, inclusive, com
aproveitadores. Uma pessoa fez com que ele pagasse R$ 3.500, que pegou em um
empréstimo, achando que pegaria a habilitação de volta. "Descobri que
tinha sido passado para trás quando, em uma blitz, soube que minha carteira
seguia bloqueada."
Em 2018, depois de "muita coisa não entrar na cabeça" na
escola, ele reencontrou a professora Beatriz Casemiro, que se tornou
fundamental para que as letras enfim fizessem sentido. Ele a conheceu no
primeiro ano de EJAI, porém, Beatriz assumiu a coordenação e deixou a sala de
aula. No segundo semestre de 2018, ela voltou a dar aulas para o senhor José. "Ele foi chamado de analfabeto por um delegado, mas tem muita bagagem de vida
que qualquer um. Ele é alfabetizado pelo mundo", conta a professora, sem esconder a
admiração pela conquista do aluno.
Segundo ela, o trabalho não foi apenas o de ensinar, mas de
deixa-lo confiante e com autoestima elevada. "Trabalhei também o método fônico
com o senhor José e foi assim que ele aprendeu. Agora ele passou da segunda
para a terceira série."
A dedicação da professora também foi além de ensinar como
juntar as letras e os sons. Ela mostrou o significado das placas de trânsito
para sr. José, que aprendeu e deu show na prova realizada recentemente. "Foram
duas vitórias. A primeira foi tirar da cabeça dele todo o mal que aquele
delegado causou. A segunda é ver o senhor José outra pessoa: um aluno feliz e
realizado. Eu, mais que ninguém, sonhei com isso. Temos em comum muita fé e as
nossas orações também ajudaram." A turma toda também incentivou e agora vai
marcar uma confraternização para celebrar a conquista do senhor José.
Hoje, a dedicação de José aos estudos não está apenas nos cadernos que leva ao EJAI. Na mercearia que mantém na Vila Chacrinha, o aprendizado está em lousas, onde ele treina a escrita e os números. E, dentro de uma simplicidade sem fim, sr. José reconhece na vitória recente as qualidades de quem deu a mão para que os novos passos fossem possíveis. "Tenho muito respeito pela figura dos professores. Não só na presença, mas na ausência. Sou muito grato e todo mundo deveria ser."